sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Prefácio

Anselmo não é apenas um transeunte social. Mais do que isso, é um andarilho dos pensamentos. Divaga horas por dia simplesmente buscando respostas para questões que lhe aparecem. Acredita que a vida não se justifica pelo possuir ou aparentar, mas pelo ser e agir de cada indivíduo. Entrementes, não considera esta uma verdade absoluta, considera apenas como um ponto de vista, sujeito à maiêutica de Sócrates.

Por muito tempo inquietou-se com uma pergunta dirigida a si por uma professora do ensino fundamental. Na época, lembra claramente, estava na oitava série em uma escola pública de Porto Alegre. A pergunta era simples, mas a resposta complexa. Apesar de tê-la respondido então, sabia que não estava definida; era uma pergunta que exclusivamente o tempo lhe traria a completa compreensão.

- Anselmo, o que você pretende ser na vida?
- Eu quero ser Economista professora.
- Que convicção! Já sabe onde fará o curso?
- Sim. Quero estudar na UFRGS.
- Então, continue estudando bastante e conseguirá.

Foi simples assim a conversa: sem delongas; sem pormenores. Era uma pergunta que indiretamente afirmava uma verdade: até aquele momento, Anselmo não era ainda coisa alguma, e se não fizesse por merecer, nunca o seria. Em meio a tudo o que foi conversado entre aluno e professora durante aquele ano, até mesmo os conteúdos aprendidos, nada ficou tão registrado em sua recordação quanto este diálogo; permaneceu até hoje, dezesseis anos após, arraigado em seu pensamento. “O que você pretende ser na vida?” A pergunta não foi específica, podia se tratar da vida profissional, pessoal, espiritual, matrimonial, enfim, qualquer vida. Nesse caso, a sua resposta foi sobre profissão.

Aquela não foi a melhor réplica. Na vida não somos o que credenciais e diplomas representam. Na vida não somos o que outros dizem de nós. Não somos passíveis de ser resumidos em apenas um parágrafo; muito menos em uma frase de uma linha, como aquela de dezesseis anos atrás. Mesmo hoje, tendo alcançado tudo o que a norma social considera invejável: uma boa profissão, um ótimo salário, bons carros, viagens anuais e muito mais; Anselmo sabe que o que define quem nós realmente somos é muito simples, independente de qualquer status social ou idade. Ele recorda de tudo isso nesse momento, pois a professora que lhe desferiu aquela pergunta lançará em breve um livro didático intitulado: O futuro das escolas e das crianças brasileiras. Sendo que, para escrever o prefácio do livro, ela lembrou-se deste aluno, que sempre tirava boas notas e que é atualmente reconhecido e bem sucedido no meio social. Anselmo se sente lisonjeado com o convite, e responsável por levar uma mensagem que ele considera muito importante para a sua vida. Daquilo que escreveu para o prefácio, as últimas palavras são uma opinião sincera e significativa sobre a questão que lhe permeia há tanto tempo o pensamento, e que somente agora pode responder com propriedade e vívida experiência.

“... Não importa onde você está, mas sim aonde quer chegar. Não importa aonde quer chegar, mas o que fará para chegar. Não importa o que fará para chegar, mas o que se tornará quando chegar. Entretanto, na vida nunca se chega a um lugar definitivo, nunca se pára após ter conquistado um objetivo. Na vida, as pessoas sempre estão em algum lugar, sempre fazem alguma coisa e sempre são alguém. O momento certo para estar, fazer e ser, é agora, o presente. E o futuro será o reflexo de quem você é, e a verdade sobre quem, na verdade, sempre foi.”

Anselmo espera que a professora goste do prefácio que ele escreveu.


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